Em artigo, auditor fala sobre o impacto da pandemia na atividade de Auditoria Interna Governamental

“É exatamente por ser um momento emergencial, em um cenário de escassez crescente de recursos, que a Auditoria Interna Governamental tem como oferecer a sua contribuição”, afirma o AFFC Marcus Braga. Leia na íntegra

 

Auditoria interna em campanha

por Marcus Braga *

 

Sim, estimado leitor…é mais um texto sobre nosso momento Covid-19 (Novo Corona Vírus). É o assunto do momento, que nos leva a reflexões, que podem orientar melhor o nosso proceder, seja em uma via pessoal, como cidadãos, seja em aspectos mais estratégicos de nossas atuações profissionais, até por que tudo é novidade no que se refere a dimensão do ocorrido.

 

Como lembrado pela Chanceler Ângela Merkel, em sua fala à nação alemã em 18/03/2020, não temos um evento dessas proporções desde a Segunda Grande Guerra, que terminou faz 75 anos. Nem a Pandemia do H1N1 (2009), o Ataque de 11 de setembro (2001), o Terremoto do Haiti (2010), e o Tsunami na Tailândia (2004), nenhuma dessas situações do Século XXI mexeu tanto com a humanidade como essa pandemia, pelas próprias características de difusão e de quarentena exigidas, com efeitos ainda não mensurados,  afetando outras esferas e  globalmente.

 

No que se refere a nossa função Controle Interno, tem-se efeitos já sentidos na mudança de calendários de contas anuais, adaptações das atividades de ouvidoria e transparência para atender essa nova especificidade, bem como indicações de ações internas dos órgãos para mitigar e gerenciar os riscos associados ao novo vírus, e a reflexão da importância da gestão de riscos nesse momento, pela oportunidade de acionamento de planos de contingência, em uma visão que se faz presente e lembrada, face ao evento que se apresenta.

 

Mas, esse singelo texto trata de uma forma de atuação relevante para a atividade de Auditoria Interna Governamental, que pode ser dinamizada nos diversos entes e poderes, todos envolvidos nessa ação emergencial. Mas, como em uma guerra instalada, com todos em suas casas isolados, com restrições de transporte e de locomoção, iremos pensar em auditoria? Isso vai atrapalhar esse momento tão delicado!

 

É exatamente por ser um momento emergencial, repleto de riscos emergentes, em um cenário de escassez crescente de recursos, que a Auditoria Interna Governamental tem como oferecer a sua contribuição. Assim como na campanha de guerra, no socorro aos desastres naturais e nas pandemias, existe um esforço dos governos na coordenação de atores e na promoção de políticas emergenciais, esse esforço não imuniza a gestão dos riscos. Pelo contrário. Os potencializa!

 

Nesse contexto, a boa e velha auditoria interna, avaliadora, indutora da melhoria dos controles internos, uma ferramenta de terceira linha de defesa, tem condições de auxiliar, seja na dimensão ex-ante, seja na ex-post, as coisas fluírem melhor. Nosso papel é adicionar valor à gestão, e se os governos agem, sempre há possibilidade de aprimorar e assegurar de forma razoável a eficácia, se a auditoria interna souber trabalhar com ações pontuais e alinhadas.

 

Vamos exemplificar! Se a pandemia demanda ações de repasse de recursos à cidadãos elegíveis, para os diversos fins, a ação ex-ante da auditoria interna sobre o desenho do processo de concessão pode auxiliar na construção de controles, e uma ação ex-post, com bases de dados, pode cessar pagamentos indevidos, garantindo a economicidade e a efetividade da ação, de forma dinâmica.

 

Outro exemplo é no processo de aquisição de insumos emergenciais, que terminam por ter seus preços inflados por questões de demanda, e a exigência de requisitos de habilitação se vê mitigada, pelas mudanças no mercado frente a pandemia, gerando receios nos compradores, por uma atuação em um ambiente incerto e pouco usual.

 

Além de discussões ex-ante na formulação desses desenhos, ações pontuais de verificação, mediante amostra (auditoria não é gestor), das liquidação das entregas de material, verificando as  suas especificações, é uma oportunidade de aferir a efetividade dos controles, para garantir que os insumos corretos estejam chegando nos profissionais, e informando a tempo aos decisores os problemas ocorridos e que podem atrapalhar toda a ação contingencial. Nessas horas se vê a importância de uma avaliação independente.

 

Esses exemplos demandam da auditoria interna uma flexibilidade e um dinamismo que ela não está acostumada. Um ânimo de adaptar seu modo de trabalho para situações emergenciais, de grande volume e velocidade de transações, que demandam ritos específicos de verificação, alinhados e mais objetivos. Uma adequação às contingências que fornece a Auditoria Interna um papel moderno e estratégico, pois o que é sistemático, planejado, é relevante, mas diante de fatos dessa natureza, é preciso lembrar do assistemático que dê conta do novo, mas essencial.

 

* É Auditor Federal de Finanças e Controle (AFFC). Doutor em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento pela UFRJ (GPP/PPED/IE/UFRJ), é autor de livros e artigos na área do controle governamental.

 

Fonte: Conaci