Dilma manda investigar ministro

Mais um ministro terá de justificar o uso do cartão corporativo. A Controladoria-Geral da União (CGU) incluiu ontem Altemir Gregolim, da Secretaria de Aqüicultura e Pesca, na investigação aberta para identificar eventuais excessos na utilização do serviço. Em 2007, Gregolin registrou R$ 22,7 mil em gastos. Também é alvo da CGU a ministra Matilde Ribeiro, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, que somou R$ 171,5 mil em despesas no cartão.

Houve um clima de mal-estar no Palácio do Planalto por causa da apuração. A controladoria divulgou que a ministra Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil, havia pedido o pente-fino nos gastos atribuídos a Gregolim e Matilde. As pastas da Pesca e da Igualdade Racial são vinculadas à Presidência e respondem à Secretaria de Controle Interno (Ciset) e, portanto, fora da alçada da CGU.

Para tentar contornar a saia-justa, assessores do Palácio do Planalto alegaram que os dois ministros se prontificaram a dar explicações à controladoria e que Dilma apenas encaminhou a solicitação da dupla. No início da noite, assessores da CGU informaram que a versão da ministra da Casa Civil estava correta e que coube a ela apenas o encaminhamento das solicitações.

Em nota, a Secretaria de Pesca reforçou que não houve pedido de investigação das contas do cartão do ministro. “Houve sim, uma disposição do ministro em apresentar suas prestações de contas à Controladoria Geral da União, para que não restassem dúvidas à respeito dos seus gastos em viagens oficiais. Essa posição foi informada à ministra Dilma pelo ministro Gregolin”, informou.

Ainda segundo o comunicado, uma comissão da Ciset esteve na secretaria e não teria encontrado irregularidades nas contas de Gregolin. O ministro da Pesca gastou no cartão R$ 22,7 mil em 2007. Chamou a atenção os R$ 70 pagos a uma famosa choperia de Ribeirão Preto (SP). De acordo com a assessoria do ministro, a despesa se referiu a refeição durante viagem oficial.

Desigualdade
Os gastos da ministra Matilde Ribeiro, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, somaram mais de R$ 240 mil nos últimos 18 meses, dos quais R$ 171 mil foram registrados entre janeiro e dezembro do ano passado, incluindo despesas com locação de veículos e até compra no valor de R$ 461 em um free-shop — dinheiro que ela teve que restituir aos cofres públicos.

No primeiro semestre de 2007, Matilde recebeu ainda do governo cerca de R$ 13,4 mil em diárias de viagens, segundo informações do Portal da Transferência, mantido na internet pela CGU. De acordo com a assessoria de imprensa da ministra, essas diárias se referiram a viagens ao exterior, onde o cartão corporativo utilizado pela administração federal não tem validade.

O Ministério Público Federal em Brasília também investiga o uso de cartões por autoridades e servidores da União. Consideradas de difícil fiscalização, as despesas quitadas por intermédio desse serviço ultrapassaram a marca de R$ 75 milhões em 2007, 127% a mais do que o montante registrado em 2006 (R$ 33 milhões). O MPF prepara uma recomendação a ser encaminhada à Presidência para que os cartões sejam utilizados dentro dos fins previstos na legislação.

Em 2007, segundo a CGU, a Presidência gastou R$ 15,9 milhões com os cartões. Sob a justificativa de comprometer a segurança do presidente da República, as informações relativas a quase todo esse montante — cerca de R$ 15,2 milhões — são secretas. Não há dados disponíveis sobre quem, quando, onde e como foram gastos os recursos. São pagamentos e saques realizados por funcionários da Secretaria de Administração do Planalto e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

O número

–>13,6 mil
é a quantidade de cartões corporativos nas mãos de autoridades e servidores da administração federal, de acordo com o Ministério do Planejamento

O número

–>R$ 75 milhões
foi o total de despesas quitadas com os cartões corporativos, 127% a mais do que o montante registrado em 2006 (R$ 33 milhões)


análise da notícia
Faltam transparência e controle

Desde a idéia inicial, os cartões de crédito do governo são a receita perfeita de um escândalo esperando para acontecer. É coisa de almanaque. Uma forma de integrantes gastarem sem controle do Congresso e com muitas barreiras para a vigilância do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público. É dinheiro no bolso, fácil de gastar. Está ali, na hora de pagar o jantar com os amigos, a cervejinha no fim da tarde ou alguma compra no free-shop do aeroporto.

Vale ressaltar que a idéia surgiu no governo Fernando Henrique. E também que certamente há muita gente que carrega o cartão no bolso e só gasta escrupulosamente. Mas isso não resolve o problema principal. Quem paga a conta tem direito a ver a fatura do cartão de crédito. E quem paga a conta dos gastos ministeriais é a sociedade brasileira.

O governo sempre responde que os cartões dão praticidade aos gastos. Verdade. Ninguém reclama disso. A grande queixa é contra a falta de transparência e controle sobre as despesas. Os cartões do governo repetem a experiência dos usados por executivos de grandes empresas. Mas no caso das empresas privadas, o executivo precisa se explicar direitinho na contabilidade. De outra forma, é salário indireto. E isso, o Brasil não está disposto a pagar.

entenda o caso
Gastos elevados

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O governo aderiu aos cartões corporativos em 1998, durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, sob o argumento de facilitar a rotina de pagamentos na administração pública. O serviço permite a realização de pequenos gastos ou saques sem autorização prévia.

Existem hoje 13,6 mil cartões corporativos em poder de autoridades e servidores, segundo informações do Ministério do Planejamento. O serviço pode ser acompanhado pela internet no Porta da Transparência, administrado pela Controladoria-Geral da União (CGU).

A portaria nº 41, editada pela pasta do Planejamento em 2005, definiu as regras de utilização do cartão. A norma estabelece, por exemplo, o pagamento de diária de viagem a servidor, destinada às despesas com hospedagem, alimentação e transporte. Antes, era feito um adiantamento do valor respectivo da ajuda de custo na conta bancária do funcionário em missão oficial.

Na avaliação do governo, a utilização do cartão em lugar das tradicionais contas com talão de cheque (suprimento de fundos) diminui a burocracia e permite aos gestores de áreas controlar os gastos de seus funcionários com pequenas despesas e saques em viagens.

A facilidade na fiscalização defendida pelo governo não livrou o serviço de irregularidades, como as notas frias apresentadas para justificar gastos relacionados à Presidência da República — fato que motivou, em 2005, a abertura de investigação no Tribunal de Contas da União (TCU).

O TCU identificou deficiência no controle de gastos e avaliou que os saques com os cartões estavam elevados. O tribunal recomendou à Casa Civil mais transparência nas informações e melhoria nos sistemas de controle, além de restrições aos saques para pagamentos de despesas. O percentual de retiradas em dinheiro em relação ao total de gastos chegou a atingir 41% em 2004.

O serviço volta a render polêmica por causa dos gastos realizados pela ministra Matilde Ribeiro, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, vinculada à Presidência. Nos últimos 18 meses, Matilde acumula mais de R$ 240 mil em despesas quitadas com o cartão, incluindo até compra em free-shop, no valor de R$ 461 — dinheiro devolvido por ela aos cofres públicos.
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