O último painel do Seminário MP 520, que aconteceu no auditório da Procuradoria Geral da República na tarde desta quarta-feira (6), discutiu aspectos jurídicos e econômicos da criação de empresa pública para gerir os hospitais universitários do Sistema Único de Saúde. Os participantes foram unânimes em classificar tal solução encontrada pelo governo como “esdrúxula”, para dizer o mínimo.
A 2ª vice-presidente do Sindilegis e especialista em finanças públicas, Lucieni Pereira, abordou o aspecto econômico-fiscal envolvido no debate. A Carta Magna e a Lei de Responsabilidade Fiscal foram o pano de fundo de sua exposição. Para ela, o cerne da questão está em como essa nova empresa pública – a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A. – se manterá. A resposta está na Constituição. “Para se implantar o modelo almejado pelo governo nessa MP, uma emenda constitucional deveria ser aprovada, para promover uma reforma administrativa. Para a lei de responsabilidade fiscal, empresa pública dependente é aquela que recebe dinheiro do orçamento da União.”
Outro aspecto abordado por Luiceni foi a adoção da forma de sociedade anônima. “Ora, as S.A. têm fim lucrativo. Ou essa nova empresa terá como finalidade o lucro, ou o nome S.A. é apenas um detalhe no texto?”, indaga. Ela concluiu dizendo acreditar que “essa MP seja um teste legislativo para ver como as Casas reagem para que se possa emplacar a minuta de lei orgânica”.
Sérgio Andrea, membro da Comissão de Juristas do Ministério do Planejamento, também revelou inquietação sobre a forma de S.A. “As sociedades anônimas são forçosamente empresariais, desenvolvem atividades econômica com fins lucrativos. Dessa forma, essa nova empresa pública pode passar a aceitar sócios, tornando-se pluripessoal. Empresa pública com caráter de S.A. não terá condição de fazer algo diferente da atividade do ponto de vista jurídico, já que é uma proposta desnaturada”, afirmou.
Luis Carlos Palácios, vice-presidente do Fonacate e presidente da Unafe, levantou outra questão: a emenda 40 pode abrir um grave precedente de incorporação de servidores sem concurso nos quadros de uma empresa pública. “A Constituição estabelece claramente em artigo 37, inciso II, que a única forma de acesso permanente ao serviço público é por meio de concurso. A emenda 40 burla esse dispositivo da lei maior e pode gerar um precedente perigoso para a União e para a saúde”.
Quem também demonstrou desconforto com a proposta da MP 520 foi o desembargador e professor de Direito Administrativo e Constitucional, Jessé Pereira Junior. “Essa empresa que o Executivo quer criar será unipessoal, passando todas as ações para a competência da Justiça Federal, o que geraria um acúmulo de processos maior que o existente atualmente”, antevê.
O desembargador também teme que a concentração da gestão da saúde nas mãos de uma empresa enfraqueceria a solidariedade constitucional dos outros entes da federação. “Essa federalização não agrediria a Constituição, que quer o sistema de saúde pública solidário? Essa MP não me soa apta para atender as reais demandas do setor”, concluiu.