Entidades criticam aumento da dívida dos Estados e Municípios com a União

Normas da União elevaram a dívida de Estados e Municípios de R$ 121 bilhões em 1999 para R$ 396 bilhões em 2011, no cômputo nacional. Este aumento da ordem de 589%, diante de uma inflação oficial acumulada de 133%, foi criticado por 120 entidades da sociedade civil – dentre elas o Unacon Sindical – na tarde desta quarta-feira, 15 de maio, na Sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB Nacional). O “Ato Público pela Revisão da Dívida dos Estados e Municípios com a União” é uma promoção de vários movimentos sociais, dentre os quais a “Auditoria Cidadã da Dívida”. Manifesto de repúdio contra o aumento dos encargos foi aprovado ao fim do encontro. Rudinei Marques, presidente do Unacon Sindical, representou a carreira de Finanças e Controle com a apresentação de “Carta Aberta à Sociedade”, onde destaca que a “contabilidade criativa” adotada pelo governo federal fragiliza a credibilidade que sempre caracterizou a relação da carreira com a sociedade brasileira e com organismos internacionais. 

Parlamentares, entidades de classe e movimentos da sociedade civil lotaram o plenário da OAB. Todos engajados pelo sentimento de protesto contra o aumento da dívida dos Estados e Municípios com a União. Ligado ao tema, Marques questiona a adoção de algumas “manobras fiscais” que vêm sendo tomadas para “inflar” o superávit primário. “O Tesouro Nacional alega que as operações estão dentro da legalidade e sob o amparo da moralidade pública. Como se pode garantir isto, haja vista a contabilização de vultosos dividendos por empresas estatais que amargaram prejuízos nas bolsas? Essas e outras práticas foram duramente criticadas por analistas do mercado financeiro e por agências de rating e publicações internacionais”, diz.

O chamado de Marques é pela ampliação do debate. “Conclamamos a sociedade brasileira a aprofundar este tema, no intuito de otimizar a aplicação dos recursos públicos evitando privilégios a grupos e setores econômicos, promovendo a igualdade e a justiça social”, finaliza.

Marcus Vinicius Furtado, presidente da OAB Nacional apontou como medidas urgentes a mudança do índice de correção dos contratos feitos pelos estados e municípios com a União há mais de dez anos e uma repactuação das dívidas. “Se a realidade econômica de uma nação é distinta do momento em que o contrato foi subscrito, ele deve ser readequado e reequilibrado, para evitar a onerosidade excessiva em relação a uma das partes”, avalia em referência ao aumento de 589%, entre 1999 e 2011.

“Estados e municípios, renegociando essas dívidas, terão mais condições para prestar serviços de saúde, educação e, inclusive, investir no sistema de Justiça, além de ter mais condições para o pagamento dos precatórios judiciais”, complementa Furtado, que avalia o montante de dívidas como um sério entrave à execução de políticas públicas previstas na Constituição Federal.

MANIFESTO

O encontro encerrou com a leitura do “Manifesto pela Revisão da Dívida dos Estados e Municípios com a União”, assinado por 120 entidades representativas da sociedade civil. O documento levanta questionamentos sobre os termos exorbitantes do financiamento, os exagerados encargos financeiros aplicados aos contratos e a necessidade de transparência no processo de endividamento dos Estados e Municípios. Leia, logo abaixo, a íntegra do documento.

 

MANIFESTO PELA REVISÃO DA DÍVIDA DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS COM A UNIÃO

As entidades signatárias e demais participantes do Ato Público pela “Revisão da Dívida de Estados e Municípios com a União”, considerando que o Brasil é organizado politicamente como uma federação e que todas as esferas políticas – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – devem respeitar mutuamente os limites de autonomia de cada ente federado para um harmonioso funcionamento:

• Defendem a necessidade de imediata revisão da dívida de Estados e Municípios com a União, que alcançou nível insustentável para os entes federados, impondo grave sacrifício social à população, que se vê subtraída em seus direitos fundamentais. Faltam recursos para investimentos em áreas prioritárias como saúde, educação, segurança, infraestrutura; para o pagamento dos precatórios judiciais e para o atendimento a tantos direitos humanos e sociais ainda negados a milhões de brasileiros;

• Questionam os termos exorbitantes dos refinanciamentos dessas dívidas, celebrados com base na Lei n° 9.496/97 (aplicada aos estados), Medida Provisória n° 2.192 (PROES) e Medida Provisória n° 2.185 (aplicada aos municípios). Essas normas legais tiveram sua gênese em acordos celebrados nos anos 90 pela União com o Fundo Monetário Internacional – FMI;

• Apontam os exagerados encargos financeiros aplicados aos contratos, com projeções bastante sombrias à sustentabilidade e ao equilíbrio das contas públicas, ameaçando o Pacto Federativo e a Democracia. De acordo com dados do Tesouro Nacional, ao final de 1999, a dívida dos Estados, refinanciada pela União, era de R$ 121 bilhões. De 1999 até 2011, os Estados pagaram R$ 165 bilhões, portanto, valor muito superior à dívida refinanciada. E, mesmo assim, a dívida atingiu o saldo devedor de R$ 369 bilhões ao final desse período.No período de 1999 a 2011, os contratos menos onerosos assinados pelos Estados – que estabeleciam remuneração nominal composta por atualização pelo IGP/DI acrescida de juros de 6% a.a. – tiveram encargos contratuais que atingiram 589% diante de uma inflação oficial acumulada de 133%. Esta exorbitante diferença de 456% corresponde ao total dos juros reais pagos pelos Estados à União;

• Alertam para a necessidade de transparência no processo de endividamento dos Estados e Municípios mediante realização de auditoria com participação da sociedade, poisé a população quem suporta o peso do seu pagamento e assim tem o legítimo direito de conhecer o processo de geração dessas dívidas e os mecanismos do seu espantoso crescimento;

• Reivindicam o saneamento dessa injusta situação que tem levado Estados e Municípios ao absurdo de contraírem empréstimos externos – com Banco Mundial e bancos privados internacionais – para destinarem recursos ao pagamento de encargos financeiros com a União; e

• Reivindicam, ainda, com base em levantamentos e estudos técnicos já realizados pela sociedade civil, que se faça a revisão inadiável desses contratos desde a sua origem, atendendo aos seguintes pilares:

1) recalcular, retroativamente à data da assinatura dos contratos, a remuneração que seria devida à União, limitada ao IPCA e sem a cobrança de juros;

2) aplicar sobre os saldos devedores remanescentes o IPCA e sem a cobrança de juros;

3) limitar a 6% o comprometimento da receita líquida real para o pagamento das prestações futuras.

Plenário do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil Brasília – DF, em 15 de Maio de 2013.