Barbosa suspende decisão de Lewandowski sobre pedido de Dirceu
Presidente do Supremo afirmou que decisão de ministro, ‘importou um atropelamento do devido processo legal’, por ele não ter ouvido previamente o Ministério Público
Autores: Felipe Recondo e Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de S. Paulo
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, cassou nessa terça-feira, 11, a decisão do ministro Ricardo Lewandowski que determinava a análise imediata do pedido feito pelo ex-ministro José Dirceu para trabalhar fora do presídio da Papuda, em Brasília. Essa foi apenas uma das quatro medidas tomadas por Lewandowski no mês passado que Barbosa revogou. As outras se referem a aumentos de IPTU em três cidades do País. O episódio deixa mais tenso o clima entre os dois magistrados, que protagonizaram uma série de embates no julgamento do mensalão, em 2012.
No caso de Dirceu, Barbosa cassou a decisão do colega por conta própria, sem que tenha sido provocado por um recurso. Quando Barbosa estava de férias no mês passado, Lewandowski, como presidente interino do Supremo, determinou que a Vara de Execuções Penais (VEP) analisasse com celeridade o pedido feito por Dirceu para trabalhar num escritório de advocacia enquanto cumpre pena de 7 anos e 11 meses por envolvimento no mensalão.
Antes, a Vara de Execuções havia suspendido a tramitação do pedido de trabalho externo, argumentando que precisaria investigar a suspeita de que Dirceu teria usado telefone celular de dentro da cadeia. A direção do presídio da Papuda informou ter apurado o caso e concluído que Dirceu não utilizou celular dentro da cadeia. Apesar disso, o inquérito disciplinar ainda está em curso. A Vara de Execuções decidiu que não avaliaria o pedido da defesa de Dirceu até que a investigação fosse concluída.
Os advogados de Dirceu, José Luís Oliveira Lima e Rodrigo Dall’Acqua, recorreram da decisão. Durante o recesso de fim de ano, Lewandowski analisou o recurso, afirmou que a suspeita de uso de celular dentro do presídio foi devidamente apurada e, por isso, determinou o prosseguimento da avaliação do pedido feito pela defesa de Dirceu.
Nessa terça, ao cassar a decisão, Barbosa afirmou que Lewandowski “acolheu sumariamente” o pedido da defesa do ex-ministro. E disse que a decisão do colega “importou um atropelamento do devido processo legal”. Ou seja, agora Dirceu terá de esperar o fim do inquérito disciplinar para ter o pedido analisado.
Barbosa argumentou que Lewandowski deveria ter ouvido o Ministério Público e a Vara de Execuções Penais antes de determinar a sequência do pedido de trabalho externo. Nesse ínterim, o Ministério Público do Distrito Federal deu parecer favorável ao pedido de Dirceu para que trabalhe durante o dia e volte ao presídio à noite. Mas o Ministério Público não se manifestou ainda sobre a possibilidade de o pedido de trabalho externo ser decidido antes de concluída a investigação sobre o uso de celular.
Em outros dois processos, Barbosa reverteu decisões de Lewandowski sobre o reajuste do IPTU nos municípios de Caçador (SC) e São José do Rio Preto (SP). Nestes casos, porém, havia recursos contrários à decisão de Lewandowski e que deveriam ser analisados por Barbosa. Nessa terça, o presidente julgou os recursos e restabeleceu as decisões judiciais que impedem as prefeituras das duas cidades de reajustar o IPTU.
‘Populismo’. Na segunda-feira, um comentário feito por Barbosa em sessão administrativa e secreta do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) atacava outra decisão de Lewandowski proferida durante o recesso, afirmando que o colega havia feito “populismo judicial”.
Nesse caso, a advogada Deborah Maria Prates Barbosa, que é cega, argumentou que o sistema usado pelo STF de peticionamento eletrônico não está adaptado para pessoas que não enxergam. Assim, pedia ao STF autorização para encaminhar os processos em papel. Barbosa negou o pedido, afirmando que a advogada poderia contratar uma pessoa para ajudá-la a usar o sistema eletrônico do tribunal. Lewandowski reverteu a decisão e autorizou a advogada a encaminhar os processos em papel enquanto o STF não adaptar seu sistema a pessoas com necessidades especiais. Para ele, impedir a advogada de atuar seria uma violação à dignidade da pessoa humana.
A relação entre Barbosa e Lewandowski se deteriorou durante o julgamento do mensalão. Nas sessões, Barbosa acusou o colega de fazer chicanas e até de advogar para os réus do processo. Em um dos episódios, fora do plenário, os dois tiveram de ser separados para que a discussão não virasse uma briga. Barbosa foi o relator do julgamento do mensalão. Lewandowski foi o revisor. Ambos não deram entrevistas nessa terça.
Senado prepara lei antimanifestações com penas de até 30 anos de prisão
Proposta em tramitação no Congresso permite enquadrar como terrorista quem participa de protestos violentos, com pena que pode chegar a 30 anos de prisão. Texto, no entanto, ainda não tem consenso entre os parlamentares
Autora: Amanda Almeida
Fonte: Correio Braziliense- 12/02/2014
O Senado prepara a votação de projeto que, segundo especialistas, abre brecha para a condenação de manifestantes como terroristas, com pena de 15 a 30 anos de reclusão. A proposta virou prioridade na pauta dos senadores na esteira da morte do cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, atingido com um rojão durante um protesto no Rio de Janeiro. O PT se posicionou ontem contrário ao texto pronto para votação em plenário, mas, afinado ao Palácio do Planalto, admitiu que tem pressa na apreciação de alguma matéria em relação ao tema, por causa da proximidade da Copa do Mundo e da repercussão negativa na mídia estrangeira sobre a segurança pública no país.
O texto, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), não tem consenso entre os senadores, mas o apoio de bancadas expressivas, como a dos próprios peemedebistas, que devem ficar com a relatoria do projeto no plenário. A matéria já passou por comissão especial e está pronta para a análise dos senadores. Em reunião ontem, os líderes partidários decidiram deixar a votação para daqui a 15 dias e, enquanto isso, tentar “ajustar” o texto de maneira que agrade à maioria das legendas. Uma das ideias é fazer um substitutivo à proposta, incorporando trecho do relatório sobre o novo Código Penal, que ainda aguarda votação e também trata do tema.
O texto de Jucá diz que terrorismo é “provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoa”. Para especialistas, o conceito é vago. “Tal como esta redigido, o texto implicará não apenas a possibilidade de incriminar movimentos sociais, mas também violará diretamente o princípio da legalidade. Para que uma lei penal seja legítima, é preciso que ela defina de forma iniludível a conduta criminosa. Não basta dizer simplesmente que constitui crime infundir terror ou medo coletivo, porque esses conceitos são muito fluídos e incapazes de serem absorvidos pelos cidadãos”, avaliou Juarez Tavares, professor titular de direito penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e subprocurador-geral da República aposentado.
O que muda
Confira os principais pontos do PL nº 499/2013
Terrorismo
» Provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoa.
Pena
» 15 a 30 anos de reclusão
» Aumenta a punição em um terço, se o crime for praticado: com emprego de explosivo, arma química, biológica ou radioativa, ou outro meio capaz de destruir em massa; em meio de transporte público ou sob proteção internacional; por agente público, civil ou militar, ou pessoa que aja em nome do Estado; em locais com grande número de pessoas; contra os presidentes da República, da Câmara, do Senado ou do Supremo Tribunal Federal; contra chefe de Estado estrangeiro.
Cota para negros em concurso público
Fonte: Blog do Servidor/ Correio Braziliense
Apesar dos avanços em diversos campos sociais, ainda persistem as desigualdades entre negros e brancos, a segregação racial nas carreiras e as diferenças salariais superiores a 30% entre pessoas com mesmo nível de escolaridade. Fatos que comprovam, contrariando a opinião de alguns críticos, que não é apenas a educação ou a classe social que afasta as duas raças. Mas sim o preconceito e as condições adversas impostas no ponto de partida para a melhoria da qualidade de vida.
Essas foram algumas das conclusões do estudo “Reserva de vagas para negros em concursos públicos: uma análise a partir do Projeto de Lei (PL 6.738/2013, que trata do assunto)”, apresentado ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), durante seminário, na Câmara dos Deputados, promovido pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir).
O levantamento, de autoria da técnica do Ipea Tatiana Dias da Silva, comprovou que o homem negro, com 12 anos ou mais de estudo, tem rendimento médio mensal de 74,5% dos ganhos de um homem branco, enquanto a mulher negra chega a receber 43,1%, segundo dados colhidos entre 2002 e 2012. Quando a comparação aborda raça/cor dos servidores que ingressaram no serviço público federal, em atividades como a diplomacia, o grupo de cor branca representa 94,1%. Pardos e negros, 5,9%.
Já nas carreiras de nível intermediário ou fundamental, negros e pardos são 43,7%. Marcelo Néri, ministro chefe da Secretaria e Assuntos Estratégicos e presidente do Ipea, ressaltou a importância das políticas afirmativas para a auto-estima do público-alvo. Néri identificou que, do primeiro censo, de 1940, até o último, de 2012, houve um aumento no número de pessoas que se autodeclararam negras ou pardas.
“A quantidade, que vinha caindo, se reverteu, principalmente entre a população jovem, devido a várias ações que fizeram ressurgir o orgulho de ser negro”, afirmou Néri. Segundo a ministra da Igualdade Racial, Luiza Bairros, em alguns municípios, os negros são 47% do total de cargos subordinados, em funções em extinção e sem perspectiva alguma de ascenção social. “Ou seja, não são expostos às mesma oportunidades”, reforçou.
A ministra também contestou a crença de que as cotas prejudicariam o nível de excelência do serviço público. “Com base no que aconteceu nas universidades, posso garantir que não. Os cotistas, muitas vezes, tiveram notas superiores aos demais”, justificou. Àqueles que defendem cotas para todos os pobres, sem distinção, Luiza Bairros explicou que mesmo o cotista formado, com capacidade comprovada, encontra dificuldade no mercado de trabalho.
“Além disso, no Brasil, o racismo é claramente anti-negro e não anti-pobre. Mesmo pobre, o branco acaba recebendo tratamento compatível com a cor de sua pele”, reforçou Luiza Bairros. O estudo do Ipea apontou também que foram identificadas 50 leis ou projetos com o mesmo objetivo do PL 6.738 (do Executivo federal) em estados e municípios, mas alguns ainda aguardam aprovação. De acordo com o PL 6.738, as cotas de 20% para negros em concursos públicos terão vigência de 10 anos.