Em artigo, Leão questiona “Quem deseja o descontrole do SUS? ”

 

“Quem deseja o descontrole do SUS? ”. Essa é a questão central do artigo escrito por Filipe Leão, diretor do Unacon Sindical. O texto publicado no portal Congresso em Foco nesta segunda-feira, 6 de fevereiro, apresenta uma crítica às mudanças no Sistema de Controle Interno Federal promovidas por meio da Medida Provisória (MP) 765/2016. Editada no dia 29 de dezembro de 2016, a MP retira da Controladoria-Geral da União (CGU) a missão de auditar as verbas do Sistema Único de Saúde (SUS). No artigo, Leão classifica a medida como ilógica e inconstitucional, por “afastar a jurisdição do órgão central sobre verbas públicas internas, no âmbito de sua competência”.

 

Leia abaixo a íntegra do texto opinativo.

 

 

Congresso em Foco, 6 de fevereiro de 2017

 

 

Quem deseja o descontrole do SUS?

 

“Querem retirar o poder do órgão central do controle interno federal de fiscalizar as verbas do SUS, estimadas em torno de R$ 100 bilhões”, alerta auditor federal, criticando medida provisória assinada por Temer

 

Por: Filipe Leão

 

Ocultos ou declarados, os inimigos do controle são muitos. Apesar das constantes ameaças, o Sistema de Controle Interno no Brasil vem registrando inegável evolução, conforme preceitua os artigos 70 e 74 da Constituição Federal. Desde a redemocratização, e, especialmente após a Lei de Responsabilidade Fiscal, o sistema teve grande impulso com a reorientação das estruturas dos órgãos centrais de controle interno em auditorias, controladorias ou corregedorias gerais no âmbito dos respectivos Poderes.

 

Contudo, ao editar a Medida Provisória (MP) 765/2016, em 29 de dezembro de 2016, o governo federal descumpre mandamentos constitucionais e republicanos elementares, ao retirar do órgão central do Sistema de Controle Interno Federal a missão de auditar as verbas do Sistema Único de Saúde (SUS).

 

A proposta não somente é ilógica do ponto de vista administrativo como é, sobretudo, inconstitucional, na exata parte que pretender afastar a jurisdição do órgão central sobre verbas públicas internas, no âmbito de sua competência.

 

No Recurso Ordinário em Mandado de Segurança (RMS) 25943 DF, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a jurisdição da então Controladoria-Geral da União (CGU) em fiscalizar a aplicação das verbas federais onde quer que elas estejam aplicadas, mesmo que em outro ente federado às quais sejam destinadas. Reconheceu ser a fiscalização da CGU interna e feita exclusivamente sobre verbas do orçamento do Poder Executivo Federal. O STF, mais uma vez, fez bem ao país, pois, ao não afastar a jurisdição da CGU sobre as verbas federais, interpretou o real significado dos artigos 70 e 74 da Constituição Federal e de princípios como o de dever de prestar contas de administradores públicos, a eficiência, a moralidade e a publicidade.

 

No governo federal, a Controladoria-Geral da União (CGU) – neste momento denominada Ministério da Transparência Fiscalização e Controladoria-Geral da União –, decerto, é um caso de sucesso na evolução do Sistema de Controle Interno e da reestruturação de um órgão central. A partir da sua atuação, diversos entes subnacionais, por espelho, incorporaram aos seus respectivos órgãos de controle a administração de portais da transparência – com detalhamento de receitas e despesas –, a realização de auditorias e fiscalizações in loco – com averiguação interna da aplicação das políticas de saúde, educação, transporte, habitação e outros programas sociais – e, até mesmo, o combate à corrupção – por meio de operações em parcerias com órgãos policiais e de investigação criminal.

 

Ao adotar a expertise da CGU, a Controladoria-Geral do município de São Paulo, por exemplo, detectou o crescimento patrimonial de servidores e combateu a sistemática cobrança de propinas no departamento de fiscalização de tributos municipais. Conhecido como “máfia dos fiscais de São Paulo”, o escândalo representou um importante estágio no fortalecimento do controle interno, em que um órgão central do sistema, no ente municipal, incorporou técnicas sofisticadas de apuração e combate à corrupção.

 

Por ano, as verbas do SUS são estimadas em torno de 100 bilhões do orçamento federal. A CGU já deflagrou, em conjunto com a Polícia Federal e Ministério Público, mais de 132 operações especiais para combater desvios de recursos públicos na saúde representando, aproximadamente, 55% das ações realizadas. Somente em 2016, 282 milhões em recursos foram desviados e 22 prisões foram efetuadas nas operações Voadores (MA), Maus Caminhos (AM), Copérnico (BA), Desumanidade II (PB), e Black List (PE). Além disso, são avaliados pela CGU, sistematicamente, programas como o “Saúde da Família”, “Farmácia Básica” e ações de investimentos públicos na saúde, cujas recomendações tem por objetivo evitar desperdícios e otimizar a aplicação dos recursos públicos.

 

Não sabemos de onde veio a ideia de afastar o órgão central do Sistema de Controle Interno da fiscalização das verbas do SUS. Desconhecemos, também, se o teor da MP 765 foi avalizado, ou se passou despercebido pela Advocacia-Geral da União (AGU). Temos, contudo, clareza de que o conteúdo jurídico e o efeito dessa Medida Provisória são nocivos ao país. Por isso, lutaremos politicamente e judicialmente para revertê-la. Nesta empreitada, estarão ao nosso lado todos os amigos dos recursos públicos e do controle governamental.