Com estabilidade em risco, servidores públicos intensificam lobby no Congresso

Para o presidente do Unacon Sindical, Rudinei Marques, este é “o momento de fortalecer a estabilidade do serviço público sob pena de o Brasil ficar tachado de República de bananas”

As associações que representam os servidores públicos federais intensificaram o lobby no Congresso Nacional nos últimos dias para frear a reforma administrativa e o que chamam de “desmonte” do funcionalismo. Em meio a conversas com parlamentares, conseguiram a instalação de uma frente parlamentar mista, com apoio de 235 deputados e senadores. Mas precisam driblar o amparo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que endossa o discurso da equipe econômica do governo Bolsonaro de inchaço da máquina pública e necessidade de redução do quadro de funcionários nos órgãos públicos da União.

Fim da estabilidade, reformulação das carreiras, horários restritos nas repartições públicas, redução da jornada com consequente diminuição salarial. Essas são algumas das mudanças pretendidas para os servidores.

Para o secretário-geral do Sindicato dos Servidores Públicos Federais no Distrito Federal (Sindisep-DF), Oton Pereira Neves, ao almejar o fim da estabilidade no serviço público, o governo promove “terror” no funcionalismo.

“A estabilidade no serviço não é somente a vantagem para o servidor. Ela é o quesito que dá condições ao servidor de exercer sua função enquanto agente do Estado. Ele tem que exercer sua função primeiro sob as leis, senão fica vulnerável às vontades políticas de quem está no poder”, destacou ao HuffPost.

Presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público, o deputado Israel Batista (PV-DF) ressalta que a estabilidade do serviço público “garante a continuidade de políticas de Estado”. “O servidor público guarda memórias do Estado e mantém funcionando as políticas públicas que não pertencem a nenhum partido político.”

E endossou a opinião do secretário-geral do Sindisep-DF sobre a vulnerabilidade que o fim da estabilidade abre no funcionalismo. “Se nós acabarmos com a estabilidade do servidor público, ele vai ficar vulnerável às ventanias da política, às questões político-partidárias e a perseguições”.

 

A estabilidade no serviço público não é somente a vantagem. Ela é o quesito que dá condições ao servidor de exercer sua função enquanto agente do Estado.

Inchaço na máquina

 

A classe alerta que a decisão de uma reforma administrativa não deve levar em consideração apenas as contas públicas. “Com esse discurso de reduzir gastos, estão pensando só na questão fiscal, mas há que se trazer o social, o debate humano”, afirma o presidente da Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques.

Marques mencionou números que, em sua opinião, comprovam que a retórica do governo ”é falha”. Segundo ele, em 1991, eram cerca de 630 mil funcionários públicos federais ativos, contra 480 mil hoje.

“Eles [governo] consideram a máquina inchada, dizem que custa caro, que foge dos padrões internacionais, que a folha de pagamento é impagável e tem que reduzir jornada com redução proporcional de custos. Temos acompanhado nas últimas três décadas o serviço público brasileiro e o que conseguimos provar com estudos é que o discurso [do governo] constrói estigmas indefensáveis ligados ao serviço público que não correspondem à realidade”, completou.

Para Rudinei Marques, este é “o momento de fortalecer a estabilidade do serviço público sob pena de o Brasil ficar tachado de República de bananas”.

O presidente da Fonacate acredita que a conjuntura, com o que ele chamou de “intervenções na Polícia Federal, Receita Federal, Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) e Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais)”, é ideal para defender a estabilidade do funcionalismo. “É bom para que essas categorias possam mostrar a importância de terem funcionários de carreira, com histórico, com liberdade de atuação”, frisa.

Marques refere-se a embates de Bolsonaro que culminaram com demissões sucessivas, ameaças de interferência e clima de apreensão em vários órgãos do governo, em especial naqueles responsáveis pelo combate à corrupção. Como mostrou o HuffPost na última semana, a justificativa pela saída de Marcos Cintra da Receita Federal – sua defesa em torno da CPMF – não convenceu e há temor de perseguição.

Reforma administrativa 

 O deputado Israel Batista, que preside a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público, reconhece a necessidade de uma reforma administrativa, mas entende que ela precisa estar focada no aperfeiçoamento do serviço e não “na culpabilização do servidor”.

Rodrigo Maia, o “dono” da pauta da Câmara, entusiasta das reformas do governo, e um dos maiores articuladores nos bastidores do atual Congresso, é a favor do fim da estabilidade dos servidores e da possibilidade de redução salarial. Ele, porém, defende que isso valha apenas para quem entrar no serviço público após o início da vigência das novas regras.

O governo, por sua vez, ainda não definiu o modelo de reforma que pretende encaminhar ao Congresso. A proposta de emenda à Constituição (PEC) que fará parte do amplo plano de reforma administrativa a ser implementado ainda está em estudo.

Há planos também de reduzir a quantidade de carreiras na administração pública. Mas isso deve ser feito por projeto de lei.