Reforma administrativa pode aumentar corrupção no serviço público

“Se as pressões por conduta não republicana, anticientífica e pouco transparente no interior do serviço público já ocorrem hoje, imagine o que ocorrerá com o fim da estabilidade do cargo público", pondera o presidente do Unacon Sindical, Bráulio Cerqueira

Recentemente, a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) tomou uma decisão inédita: criar um grupo permanente de monitoramento sobre o combate à corrupção no Brasil.

Isso aconteceu porque a Organização, da qual o País sonhava em fazer parte, percebeu um recuo expressivo do combate à prática de corrupção no Brasil. No Congresso Nacional, a OCDE vai monitorar propostas que possam dificultar práticas anticorrupção.

Uma dessas propostas é a Reforma Administrativa, prioridade do governo e também do presidente da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pachedo (DEM-MG), ambos alinhados com Jair Bolsonaro.

Para Bráulio Cerqueira, presidente do Unacon Sindical, a decisão da OCDE indica, dentre outras coisas, uma preocupação internacional com o assédio institucional e moral contra os servidores públicos no Brasil, reforçada com a Reforma Administrativa.

“Se as pressões por conduta não republicana, anticientífica e pouco transparente no interior do serviço público já ocorrem hoje, por vezes instigadas pelo próprio governo de plantão, imagine o que ocorrerá com o fim da estabilidade do cargo público, com o recrutamento enviesado de pessoal para o Estado”, diz.

Em artigo para a Folha de S. Paulo, Sandra Silvestrini (Fenajud) declara que o Parlamento está interessado na rápida aprovação da proposta em benefício próprio. “Já que a economia calculada em dez anos é pífia e pode ser alcançada sem desmontar o setor público. Os servidores são parte fundamental da engrenagem anticorrupção, pois a estabilidade atua para que os interesses escusos não avancem por influências políticas”.

A Reforma, se for aprovada como apresentada pelo governo, libera a criação indiscriminada de cargos comissionados, acaba com a estabilidade para a maioria dos servidores públicos e permite novas formas de contratação, que transformarão o serviço público em cabide de empregos e balcão e negócios, facilitando, assim, práticas de corrupção sob influência política.

Isso é grave porque coloca em risco a prestação e a qualidade dos serviços públicos ofertados à população, principalmente aqueles de maior vulnerabilidade, para quem os serviços públicos são a única forma de acesso a direitos básicos.

Bráulio detalha as implicações que o aumento da corrupção no serviço público pode trazer para a população. “Os desvios de recursos restringem a oferta de bens e serviços públicos, como saneamento, estradas, escolas, postos de saúde etc. Além disso, evidentemente, pioram a qualidade das políticas públicas. Mas o efeito mais grave da corrupção ao longo do tempo é o solapamento da confiança da população nas instituições e na própria democracia”.

Para além dos impactos diretos na sociedade, a proposta é percebida como uma constitucionalização da precarização do emprego público, diz Bráulio. “Além disso, concede ao presidente superpoderes para fechar universidades e órgãos sem consulta à sociedade”.

Para ele, a estabilidade no cargo público e o respeito ao sistema de pesos e contrapesos entre Poderes precisam ser preservados como peça-chave no combate à corrupção na máquina pública.

“Indo mais além, o combate republicano à corrupção impõe revitalização do controle social das políticas públicas, esvaziado com o ataque aos Conselhos e fim das Conferências Nacionais nas mais variadas áreas. Pode-se também regulamentar o art. 247 da Constituição Federal de modo a ampliar as garantias de servidores contra abusos dos poderes privado e político”, conclui.

 

Com informações: Que Estado Queremos