Auditores preparam dossiês para mostrar a verdade do que ocorre na Receita

     O desmonte da cúpula da Receita Federal provocada por ação direta do Palácio do Planalto e do Ministério da Fazenda é apenas um entre tantos exemplos de ações políticas do partido do governo na administração pública. A mão pesada do PT já alcançou boa parte dos órgãos técnicos que dão sustentação ao Estado. Com a proximidade das eleições, o partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva prepara o terreno para adequar a máquina a um modelo de gestão contestado por especialistas, servidores e entidades ligadas ao funcionalismo.

     Divergências entre ministros, presidentes ou diretores de órgãos importantes provocaram sucessivas mudanças em setores que vão da regulação à Polícia Federal, passando pela área de pesquisa e meio ambiente. “É um perigo. Pode ser que o Brasil esteja copiando a Argentina, que por conveniência ideológica-partidária mexeu até nos índices de inflação”, diz Marco Antônio Villa, historiador da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).


     Polêmicas que colocaram em lados opostos altos dirigentes e o governo ficaram claras ao longo dos últimos três anos na divisão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), na substituição do comando de órgãos como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Polícia Federal e nas indicações políticas para cargos de destaque em estatais e agências reguladoras.

     Com as demissões no Fisco, motivadas pela fiscalização maior a grandes empresas, potenciais doadoras da campanha da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, à sucessão de Lula, o governo pode ainda ter detonado uma bomba de efeito retardado. Os servidores ligados à ex-secretária Lina Maria Vieira – que entregaram os cargos alegando ingerências políticas no órgão – têm informações preciosas sobre a Receita e os supostos desmandos praticados nos meses que antecederam a queda de Lina. “É possível que apareçam dossiês e que haja o uso indiscriminado de dados pessoais em favor deste ou daquele interesse. Acho que teremos em 2010 a campanha presidencial mais violenta da história do país”, completa Villa. Na avaliação do estudioso, a máquina está sendo “azeitada” para blindar a candidatura oficial e minar qualquer investida dos adversários.

     Organizados em uma superentidade, 21 associações e sindicatos que representam a elite do funcionalismo federal – cerca de 100 mil servidores públicos – protestaram. Em nota, o Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado (Fonacate) advertiu que é preciso garantir autonomia institucional. “Herança dos tempos absolutistas, cultivada com afinco durante os regimes ditatoriais, o nosso país infelizmente ainda não conseguiu o necessário aperfeiçoamento do regime democrático, pois mantém o poder do presidente da República e de ministros de Estado para nomear e afastar dirigentes de instituições com competência para o exercício de atividades exclusivas de Estado”, reforça o documento.

     O comunicado dos representantes das carreiras da Segurança Pública, Defensoria Pública, Previdenciária e do Trabalho, Tributária, Ministério Público, Advocacia Pública, Fiscalização, Finanças e Controle cobra do governo “pesos e contrapesos entre os poderes”, em referência ao Fisco. “O poder absoluto dos governos dos entes federados, sem revelar claramente a sua motivação à sociedade, dá oportunidade a que razões pessoais ou interesses inconfessáveis de partidos políticos imperem em detrimento do interesse público. Não há distinção entre motivos defensáveis e interesses impronunciáveis”, justifica o comunicado.