Ofensiva para tampar o ralo

 
Correio Braziliense – 10/09/2011
 
Depois de a CGU apontar prejuízo de R$ 682 milhões aos cofres públicos, ministério muda as regras para seleção de empreiteiras e o modelo de acompanhamento de execução das obras
 
     Para fechar o ralo por onde escorrem R$ 682 milhões, prejuízo referente a apenas 10 obras, o ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, anunciou ontem mudanças na forma de selecionar as empreiteiras e no modelo de acompanhar a execução das obras. Passos está há um mês e meio à frente da pasta, alçado ao cargo pela presidente Dilma Rousseff depois de exercer a função de secretário executivo e de ministro por períodos específicos. Ele esperou o relatório final da Controladoria-Geral da União (CGU), que apontou na quinta-feira o prejuízo de R$ 682 milhões, para definir um novo modelo para o setor de transportes. A cúpula do ministério foi demitida em julho em meio a escândalos de corrupção na execução das obras pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e pela Valec Ferrovias.
 
     Os editais do Dnit serão modificados, numa tentativa de inibir o conluio de empreiteiras que disputam os lotes licitados. Esta é uma prática antiga: as empresas se associam e dividem entre elas as obras disponíveis, acertando quem vence cada lote. O conluio foi apontado no relatório final da auditoria especial da CGU, realizada no Ministério dos Transportes, no Dnit e na Valec por determinação da presidente Dilma. Agora, os editais do Dnit trarão menos restrições às empresas. O modelo mais amplo objetiva ampliar a participação de empresas, com ofertas de preços menores do que tradicionalmente é ofertado. “É preciso fazer valer para todo mundo. Mas queremos que entrem empresas capazes de entregar a encomenda”, disse o ministro, acompanhado do novo diretor-geral do Dnit, Jorge Fraxe. Ele prometeu para a próxima semana o início do processo de mudança.
 
     A análise dos projetos de engenharia, que dão origem às obras e servem de referência para a execução dos serviços pelas empreiteiras, será retirada da sede do Dnit em Brasília e levada para as superintendências do órgão nos estados. Um engenheiro da sede e outro da regional em questão vão fazer o acompanhamento dos projetos no local das obras, segundo o ministro. Ele diz que situações como a do lote 7 da BR-101, em Pernambuco, serão evitadas. A auditoria da CGU mostrou que os prejuízos nesse trecho somam R$ 53,8 milhões, principalmente em função de superfaturamento e pagamentos por serviços não realizados. O projeto original chegou a prever um trecho dentro de um açude que fornece água para a cidade de Ribeirão. O caso da BR-101 é tratado como o mais grave pela CGU, entre as obras auditadas.
 
     “Está decidido que nenhum projeto de análise virá para Brasília. É difícil dar uma solução a 1 mil, 2 mil quilômetros do problema. A ordem baixada é para que os projetos sejam analisados no terreno”, disse o diretor-geral do Dnit. Segundo Fraxe, “os males todos nascem no projeto”. “Quando é mal elaborado, surgem os aditivos.” O ministro Paulo Passos garantiu que as supostas fraudes na terraplanagem da BR-101, no lote 7, resultarão em procedimentos de investigação contra os servidores e empreiteiras responsáveis, “com amplo direito de defesa”. Já os projetos de rodovias que ainda não foram colocados em prática, como são os casos da BR-280, em Santa Catarina, e BR-116, no Rio Grande do Sul, serão revistos. O mesmo procedimento será adotado para todos os projetos da Valec, com possibilidade de anulação de contratos. Passos disse não haver necessidade de paralisação de obras.
 
     Segundo o ministro, a presidente Dilma já autorizou a contratação de 100 engenheiros pelo Dnit, a partir de cadastros de reserva de concursos anteriores. Passos reconheceu que a fiscalização das obras é deficiente. “Agora podemos avançar com mecanismos mais aprimorados.” Ontem, o ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, explicou por que o relatório final da auditoria não trouxe nenhum culpado para os desmandos no Ministério dos Transportes, no Dnit e na Valec. “Se apontássemos responsáveis antes de ouvir um por um, em processos disciplinares específicos, essas mesmas pessoas iriam gritar, e aí com razão.”
 
O que será feito
 Confira as medidas anunciadas pelo ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos:
 
 » Revisão dos projetos de obras não iniciadas pelo Dnit e com prejuízos potenciais já apontados pela CGU. É o caso das BR-280, em Santa Catarina, e 116, no Rio Grande do Sul.
 » Revisão dos projetos da Valec, em especial a extensão sul da Ferrovia Norte-Sul e as Ferrovias de Integração Oeste-Leste (Fiol) e Centro-Oeste (Fico).
 » Diminuição da quantidade de restrições para participação das empresas nas concorrências do Dnit. A finalidade é ampliar a quantidade de empresas que disputam as licitações e evitar conluios de    empreendimentos, como detectado pela CGU.
 » Acompanhamento dos projetos das obras in loco por engenheiros da sede do Dnit e das superintendências estaduais.
 » Criação de um escritório de gerenciamento de projetos na sede do Dnit, em Brasília.